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Arte Contra Violência e Marginalidade

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Eu estava lendo a coluna do Vladimir Saflate na folha e me deparei com a afirmação:

há os que veem a cultura como ponta de lança de serviços de assistência e integração social. Mais música e menos violência –é o que alguns gostam de dizer, como se houvesse alguma forma de relação direita possível. O que abre um perigoso flanco: se o índice de violência não baixar, o investimento em música parece perder o sentido.

Isso me pareceu bem pertinente, levando em consideração a enorme demanda de projetos culturais que tem como argumento nuclear a retirada das crianças das ruas ou a inserção do sujeito na sociedade e etc; trazendo consigo uma noção antiga de que “cabeça vazia, oficina do diabo”, portanto, cabeça cheia (pode ser de artes plásticas, de música, de fotografia, de qualquer coisa) fica longe de qualquer problema social. E, da mesma forma como Foucault frisa a respeito das prisões, enfatizando que todas as prisões sempre tiveram o objetivo de reformar o indivíduo, ou seja, re-inseri-lo na sociedade retirando todo o mau-caráter e o transformando em um bom sujeito, as atividades culturais me parecem caminhar na mesma direção reformadora.

Se um centro cultural existe, oferecendo música, artes e literatura, e tem como lema retirar as crianças das ruas, do tráfico, da delinquência, do banditismo e etc, se elas não forem retiradas das ruas, então não há sentido em oferecer música e artes? Qual a ligação direta entre cultura e marginalismo? Somente o antigo proverbio, até onde eu vejo.

Mas, na verdade, se o objetivo é ocupar as mentes para não encaminhá-las para a vida marginal, então não é somente cultura que se oferece. A arte é mais instrumento de transgressão e revolução do que de legitimação – quando Hitler montou seu exército de artistas para pintar a verdadeira arte alemã, estava pintando ideologia, estava utilizando a arte como aparelho ideológico no Estado nazista. Analisando desta forma, a “arte na favela” se faz mais como uma “re-educação na favela”. A arte, a música e as iniciativas para retirar os jovens da vida bandida se mostram como maneiras de re-inseri-los na ordem vigente

Se não há inserção na ordem vigente, então não vale á pena ter arte para o povo.

Se a arte é, como afirma Caudwell, uma quebra no ciclo de símbolos que são compartilhados e herdados geração à geração em nossa sociedade, se ela é a quebra de uma ordem estabelecida e é, desta forma, a necessidade de criar sob novos pressuposto – pressupostos esses que suportem essa nova arte e a explique – então não há arte em re-educação de jovens.

Expulsão no BBB, Liquefação dos Problemas e Democracia Brotheriana

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O membro estuprador do BBB foi expulso do programa. Ponto final? Agora acabou? Fiquemos felizes e que o programa continue? Eu acho que seria de uma idiotice imensa se eu começasse a tecer críticas sobre a população brasileira que não age contra esse tipo de programas, etc e etc, ou que já se esqueceram do ocorrido, que o brasileiro se esquece dos fatos importantes etc e etc. Eu queria abordar, meio que superficialmente, a maneira como a expulsão aconteceu.

O sujeito foi expulso e o problema foi dado como resolvido. Simplesmente. Ou seja, foi uma expressão individual, idiossincrática, nada condizente com o cotidiano. Eu não acredito nisso. Creio que a questão precisa ser levada muito mais a sério. Como eu já deixei escrito no post passado, essa maneira de levar o problema é caótica. Ela coloca, por sua vez, a culpa nos participantes, individualmente, retirando qualquer tipo de responsabilidade do programa. É óbvio que o programa não incentiva o estupro, isso é claro e seria de tamanha demência, mas o programa é o fruto do entretenimento, da diversão como um fim em si – é massificação da individualidade por excelência, quando mostra os detalhes da idiossincrasia do outro.

O programa merece ser culpado somente pela existência, depois, por escancarar o que aconteceu e depois execrar o ato. Tudo isso, somente para ganhar alguns pontos no ibope. O interessante é que, primeiro o ato imoral é exibido, depois, quando o resultado objetivo é positivo, quando a audiência aumenta, quando o programa passa a ser assunto nas conversas alheias, é necessário deixar claro a posição moral da emissora e do programa em relação ao ato. A emissora não aponta o dedo para o sujeito, mas o expulsa do programa – ela absorve a crítica da massa, a reprovação do povo em relação ao estupro e, mesmo sendo, supostamente, contra sua verdadeira opinião, democraticamente (já que, quem manda no BBB é o público) expulsa o participante.

Expulsar o participante e declarar uma neutralidade venenosa sobre o caso é afirmar publicamente que os pressupostos democráticos do programa, como o respeito à decisão autoritária feita público, não foram corrompidos. O programa se passa como um bom representante da modernidade democrático-liberal, mas tenta esconder os podres que carrega em seu núcleo. Por que ele foi retirado do reality show? A nota publicada diz que ele infringiu uma regra do programa – não uma regra moral, social, uma lei formalizada e etc. Ainda não há declaração de um órgão formal sobre o caso, classificando ou não como estupro.

Também nós reparamos na posição da vítima, a moça que sofreu o abuso, sem se lembrar do que ocorreu, talvez pelo horror da situação, continua a negar o que (lhe parece que) houve. A negação dela dá o aval para a não-conclusão dos acontecimentos, entretanto, mesmo se ela não negasse e assumisse uma postura sincera, admitindo que não se lembra e, por conta disso, não pode declarar nada com objetividade, está tudo gravado, toda a situação, desde o início.

Quando a subjetividade, mesmo cínica, ganha mais espaço que a objetividade crua, creio ser necessário perguntar: até que ponto vale a opinião dos participantes? Ou melhor, até que ponto a subjetividade da vítima é verdadeira? Pois é de se pensar que a negativa da vítima aconteceu pelo próprio significado simbólico do estupro. Quem gostaria de ser estuprado e não se lembrar… Pior! Levar a culpa por isso, afinal, quem mandou beber?!

Por que há mulheres que sofrem violência doméstica e negam o fato? Não creio que a resposta “por que ama o marido” ou “por medo” seja suficiente, acho que elas precisam de um reforço: não é só por medo ou só por amor, é pelo próprio significado da violência doméstica e a desestruturação que ela representa, assim como a desigualdade, dentro do relacionamento/família patriarcal. Quando há a denuncia, tudo isso é superado, e, por isso que cada denuncia é um ato de extrema força e extremo desespero (infelizmente).

FEMEN, Protestos e Valor Subversivo da Nudez

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O FEMEN é um grupo autodenominado feminista, criado na Ucrania e que costuma realizar protestos de topless.

Antes de tudo, vou comentar sobre dois casos onde também houve a nudez como protesto. Primeiro com a Geyse Arruda. Vocês lembram de o que houve com a menina depois da aparecer com um vestido curto na faculdade? Ela foi quase linchada do local, foi necessário chamar a polícia para tirá-la de lá, ela foi alvo de violência gratuita pelos alunos da UNIBAN. Depois do acontecido, a moça ainda foi expulsa da faculdade! Como contraposição, os estudantes da UnB tiraram a roupa em protesto de apoio à Geyse Arruda.

Segundo, o Slutt Walk, em Toronto. O Slutt Walk aconteceu após um policial reclamar que as mulheres deveriam se vestir melhor se não quisessem ser estupradas. Partindo do ditado “para ser respeitado é necessário se fazer respeitar” – ou seja, se você quiser ser respeitado, seja cristão, hetero e branco. O protesto aconteceu com as mesmas características: mulheres nuas protestando sobre a maneira de se vestir. Em outras palavras, a culpa não é do vestido, a culpa é do estuprador!

Os dois protestos tiveram sua localidade no contexto. Ou seja, os dois protestos foram claramente contra uma normativa social repressiva a respeito não das roupas, mas da roupa como pressuposto de respeito à integridade física e moral. Dois protestos perfeitos, na minha visão. Ambos subverteram a própria repressão, utilizam dela para jogar a crueza da ilógica contida no discurso, em seus próprios reprodutores. Perfeito!

Agora o FEMEN, em qualquer protesto, qualquer um, as protestantes tiram a roupa, tudo isso sob a desculpa de “ser a única coisa que elas têm”  e sob a falsa antimoral burguesa de que “não deveria ser estranho ficar sem roupa”. Os dois argumentos básicos são impotentes, já que o primeiro confirma a objetificação da mulher e o segundo desloca o contexto histórico-social e dá aval pra existência do primeiro. Dizer que deveria ser normal ficar sem roupa é algo que todos nós dizemos, sabemos que se trata de norma social, porém, há um significado simbólico em tirar a roupa, tirar a roupa em um protesto contextualizado e (por consequência) subversivo e tirar a roupa por que o corpo é a “única coisa que temos”.

Ainda é interessante reparar em quais mulheres estão protestando no FEMEN… Loiras, magras de corpos completamente dentro do padrão vigente de beleza. Elas são as modelos perfeitas da Europa, quero dizer, a subversividade do movimento está em colocar mulheres completamente aceitas pelo padrão social de beleza, de topless, em qualquer tipo de manifestação, contra qualquer proposta, sob o pretexto de que aquilo é a única coisa que têm como forma de subversão.

Eu creio que o protesto gera exatamente o oposto, queima o filme do feminismo. É difícil não deduzir que a presença dos fotógrafos em massa existe pela nudez de mulheres bonitas. Só. Como um movimento feminista objetiva o próprio corpo e “coincidentemente” realiza manifestações somente com moças que poderiam ser candidatas à miss Ucrânia? E tudo isso sobre o pretexto falso de que “só temos nosso corpo”.

Não contextualizar a afirmação (que eu concordo) “Não há nada errado em mostrar os seios na rua” é esquecer que se vive em uma sociedade, onde as relações são mediadas por símbolos e que, em âmbito individual, achar que não há nada de errado é uma ação sem controle social, porém, não existe a garantia de que, ao avistarem o sujeito na rua, vão saber de suas convicções para tal ato. No protesto, por exemplo, será reconhecido o significado simbólico da nudez como birra, sem sua profundidade simbólica demonstrada na UnB ou em Toronto. A afirmação acima, então, abre espaço pra afirmação “só temos nosso corpo”. Quando a moça diz que só tem o corpo, o coloca na mesma função do dinheiro, dos contatos políticos e etc. Quase como uma arma. Porém, essa funcionalidade é subvertida pela descontextualização do próprio protesto – o protesto com nudez é banalizado (no sentido de perder sua profundidade simbólica).

Há o mesmo reconhecimento dos protestos da UnB, em Toronto e das mulheres do FEMEN? Eu creio que não, por conta disso, a nudez se torna legitimada socialmente (como contraposição ao aparelho repressivo) nos dois primeiros, demonstrando sua subversividade e rompimento com o significado social comum, para um novo significado, uma simbolização de violência contra os preconceitos sociais, contra o Estado atual, contra a ideologia hegemônica.

Prisão de Nem, Leis e Presença do Estado

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Quando o traficante Nem foi preso, além da própria notícia, outra coisa me veio: a própria questão do crime e da sua razão. Digo, Nem procurou traficantes para pagar o tratamento de seu filho, assim como várias outras pessoas procuram uma autoridade como a de um traficante na favela, para ter grana e pagar as contas, ou simplesmente entram por essa ser a única perspectiva viável que é declarada. Não há outra saída, você precisa fazer isso ou viver na miséria.

É óbvio que existem milhares de motivos para agir contra as leis, mas, primeiramente, agir contra a lei é necessariamente errado? Se a lei não é a-histórica, mas, e muito pelo contrário, só a formalização de uma moral ideológica, não garante nenhuma justiça objetiva. Digo, dentro da linguagem liberal, por exemplo, suas leis são sempre lógicas, mas, contrariando os significados simbólicos já consagrados de cada palavra ou expressão (como liberdade, direitos humanos, solidariedade e etc) conseguiremos perceber o quão podre se torna o sistema de leis. Ele é a defesa clara dos interesses de uma classe que é a representante do modo atual de produção.

Sendo assim, primeiramente, digo que não vou afirmar que tudo que é da lei é correto, mas vou dizer que o que ocorre, por exemplo, em favelas sob o controle de traficantes é consequência da anomia, ou seja, em última instância, da falta de aparelhos estatais na favela (ou a existência de uma consciência coletiva pouca consistente). Quando há essa falta, a autoridade se torna outra, tanto que Nem foi procurar traficantes para pagar o tratamento de seu filho. É um Estado dentro de um Estado.

Quando a autoridade é local e, ao mesmo tempo, mais forte que a Estatal, ela será máxima. Será o Grande Outro (O Traficante, O Tráfico).

É aqui que eu coloco como exemplo, a própria família, onde, dentro do espaço de autoridade, a violência é permitida, a humilhação é permitida, é feita pela autoridade, porém, mesmo assim, a autoridade é protegida. Enquanto haver relações de dominação, o próprio abuso é só uma manifestação legítima da autoridade, por permitir a existência de seus inferiores (filhos, filhas, aposentados, mulheres e etc). Sobre as mulheres, há uma questão boa.

Se a participação delas no trabalho social era o que faltava para acabar com as relações de dominação por gênero, por que isso ainda não ocorreu? O fato das mulheres participarem da produção não indica que o modo de produção de modificou. Ainda existe a contradição das relações do produção com as relações sociais, e a questão dos machismo/patriarcado se encontra aí. Ainda é uma herança anacrônica que luta para se manter em pé.

A própria família, com a estrutura clássica, é totalmente anacrônica. O filho não é mais o ser que irá assimilar totalmente a ideologia (o papel de aparelho ideológico está nas mãos na escola, atualmente), a mulher já participa/pode participar da produção social e não há mais argumento pseudocientíficos e pseudofilosóficos evitando tal coisa. Há somente o anacronismo das relações sociais.

Facebook, Pedofilia, Falsos Protestos e Alarmismo Liberal

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Nesta semana terminou o protesto muitcho doidcho e altamente agressivo contra a pedofilia. Trocar as fotos do perfil por desenhos animados! A proposta era colocar a foto do desenho até o dia das crianças e essa atitude representaria um manifesto contra pedofilia/violência infantil no Brasil. Nunca tive tantos amigos com perfil do Goku na vida.

Óbvio que isso gerou as risadas de muitas pessoas que não via sentido nenhum em fazer este tipo de manifesto, que isso não iria mudar nada e, como resposta, uma mensagem foi espalhada, onde dizia mais ou menos que os manifestantes sabiam que isso não acabaria com a violência infantil, nem com a pedofilia, mas já era uma forma de ação e era muito melhor que ficar com os braços cruzados. Só eu vi o alarmismo liberal aqui?

Estamos em uma situação crítica e precisamos tomar logo uma atitude, pois o a situação está prestes a explodir e ficar fora de controle, logo, em um ímpeto incontrolável, eu simplesmente ajo para contribuir com a salvação do mundo. Pronto, agora faço parte de algo maior.

Não seria esse o grande segredo dessas manifestações?

Quero dizer, e aqui puxo a mesma interpretação sobre o consumo dos vegetais éticos ou dos cafés-que-salvam-crianças-da-áfrica do Starbucks, você realmente acha que faz diferença mudar a foto do facebook? Se sabem que não, por que fazem? Como a própria resposta ressaltou, se faz por uma satisfação ética, para não ser somente mais um internauta idiota, agora você participa de algo maior, está contribuindo para a salvação das criancinhas com potencial possibilidade de serem molestadas e etc. No fim, aquele que participa de manifestações meramente cibernéticas, também é um cínico.

É exatamente por isso que devemos pensar mais, teorizar mais, raciocinar mais e fazer menos. Isso mesmo, fazer menos. Para, assim, fazer somente o correto, aquilo que é puntual. A ideologia da catástrofe nos leva a participar dessas supostas expressões éticas e solidárias sem realmente prestarmos atenção em suas consequências. Desta forma, só manteríamos condições para a existência do sistema que provoca todos aqueles males que tentamos combater.

É como lutar pela liberdade de expressão para, por exemplo, não contratarmos gays. Supostos atos de democracia, supostas lutas legítimas, porém, completamente ideológicas. É fácil perceber que as formas conservadoras são esdrúxulas, entretanto, os discursos liberais ainda são muito tentadores. O ecologismo, o vegetarianismo e seus derivados, o boicote às grandes marcas por grupos alternativos de oposição, a tolerância (mas sempre com uma certa distância), a formação de microsociedades alternativas, as supostas revoluções digitais (que nos dão o conforto do lar e a sensação de sermos parte de um movimento de modificação da sociedade, porém, sem o uso da violência (seja ela como for), com uma revolução basicamente ética), etc e etc.

O vomitório da Myriam Rios, se expondo sobre o PL 122 do Rio, e citando o caso da babá lésbica, é clássico. É aquele clássico apelo conservador sobre as falhas ideológicas liberais, conforme eu já falei nos últimos posts, e o comercial da Coca-cola,  que é a versão pseudo-revolucionário liberal de propagar o certo. No fim da propaganda, ganha aquela que apaziguou a situação e advogou pela tolerância (claro que com uma autoridade totalmente falsa, a autoridade da cozinha).

E, assim como o toddynho de detergente, e o baconzitos de rato, essa nova investida conservadora veio pra mostrar o que realmente é o liberalismo. Ou seja, esse lixo só é a verdadeira exposição do real lixo, que é a democracia liberal representativa.

I Am Curious, Toddynho, Marcha do Orégano e Não-Violência

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I am Curious é um filme Sueco, de Vilgot Sjöman, que conta a história de um diretor gravando um documentário político com sua namorada. Basicamente, I Am Curious é um filme sobre um filme, ou melhor, é um filme em um filme, onde, no fim o verdadeiro filme é o filme dentro do filme (o documentário), já o filme em primeiro plano, é como a realidade em si. Não que seja, nofim das contas, o filme é fantasia e o documentário filmado dentro do filme é a fantasia da fantasia. Isso é bem retratado até pelos nomes dos personagens, sempre coincidindo com os nomes reais.

A coisa, na verdade, não é a coisa, mas, em análise profunda, continua sendo a coisa, e aquilo que pensávamos ser a coisa, só algo para explicitar o que realmente a coisa é. Em outras palavras, vamos lembrar do caso do Toddynho, onde um lote de embalagens com toddy foram recheadas de detergente utilizado para limpar os reservatórios da fábrica responsável pelo envaze.

A ida de detergente foi, na verdade, a ida da verdadeira substância do recipiente, quero dizer, é muito mais honesto colocar detergente com pH de soda caustica na embalagem que colocar o próprio toddynho. O Toddynho é um produto industrial de larga escala que representa todos lixos industrializados, comerciais e espetaculares. No fim, trocou-se o lixo maquiado por um lixo de rosto desfigurado. A existência de detergente dentro das embalagens do toddynho só afirma que, na verdade, o próprio toddynho é o lixo. Ou, indo até contra o que eu deveria ser a favor, mas tentando fortalecer aquilo que eu acredito, poderia dar como exemplo a marcha da maconha. Apoio totalmente, mas, e a marcha do orégano?!

A marcha do orégano é como quando o pai manda o filho ir pro quarto dormir e o filho fica embaixo das cobertas, no escuro, fazendo força pra não dormir e, dessa forma, desobedecendo a lei expressa do pai.

Lá, a contestação está dentro das leis e dos costumes, digo, qual é o real impacto de uma marcha do orégano? É só a demonstração pura da infantilidade e da falta de teoria na educação política dos integrantes da manifestação. Se levarmos em conta isso, podemos afirmar categoricamente que a mesma falta de teoria falta no bojo da marcha da maconha. A marcha do orégano, sendo assim, feita por quem apoia e participa da marcha da maconha, só ressalta que a própria marcha (da maconha) é constituída, na verdade, por pseudo-revolucionários.

Se a marcha tenta destruir um determinado paradigma social, por que ela trabalha naquilo que não é horrendo para o bojo social? Por que ela não impacta nem um pouquinho as estruturas socais? Estão jogando na cara da sociedade que a maconha não é ruim fumando orégano?!

Ainda no filme, temos a tentativa de Lena, personagem principal, a namorada de Vilgot, aderir à não-violência, a proposta associada à Martin Luther King, que aparece em uma entrevista, no filme.

O que há de mais violento do que a não-violência? É bem ela que exibe à pele nua o que realmente é o aparelho repressivo estatal. A não-violência obriga o aparelho repressivo à não agir, entretanto, ele existe para a ação, então acaba sendo violento com os manifestantes não-violentos. A não-violência, naquele contexto (de Gandhi ou Luther King) era a forma subversiva perfeita contra o Estado e seus aparelhos repressivos, como a polícia.

Sexta à Noite

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Meu nome é Renan, tenho 22 anos e moro com meus pais. Não que isso seja ruim, mas não é de todo bom.

Eu respeito os valores que eles me impõe, apesar de ser gay, preciso me comportar como machão, senão meu pai me bate. Não escuto bem pela orelha esquerda, pois meu pai me bateu com uma colher de pau quando eu disse que não gostava de moças e um dia ele quase cortou meus lábios depois de me ouvir falar ‘eu te amo’ para um namorado. Não tiro a razão dele, deve ser feio criar um filho, fazer de tudo para ele ser um bom provedor e depois vê-lo assim, gay.

Não acho bonito ver dois homens se beijando na rua, é nojento. Se fosse um homem e uma mulher, tudo bem, mas dois homens é nojento. Na minha opinião quem faz isso só quer chamar a atenção e é por causa dessas pessoas que me batem no fim da balada, dizem que eu sou estranho, aberração, me socam e me empurram. Se esses depravados que ficam se pegando na rua parassem, aposto que parariam de me bater.

Quando voltei do hospital, falei pro meu pai que havia sido uma briga com um cara que xingou a mãe. Ele me olhou com um brilho que nunca tinha olhado… A verdade é que apanhei por estar com uma camiseta de arco-íris… Estava voltando do show de uma cover de Pet Shop Boys.

Minha mãe não fala muito, só vê. Fica vendo o que acontece, finge que não entende e que não é com ela. Um dia me falou que Deus vai me arrebatar. Não sei, acho que Deus não gosta de homossexuais, senão, ele tentaria me proteger daqueles playboys, ou não… Vai ver ser gay é coisa do capeta, mas o capeta não é machão?

Se o capeta é tão malvado, ele deveria ser gay, negro, mulher e anão ao mesmo tempo. Tudo que o povo não gosta. Poderia até ser Judeu, pra situação ficar um pouco pior… Tem que feder mofo e andar com o cabelo pingando óleo, além das costas cheias de tatuagens tribais.

Minha mãe disse que o capeta tenta a gente por coisas fúteis, como a bebida, o cigarro ou o sexo, ela já disse que eu sou pervertido e que o caramunhudo tinha me pegado. Não sei. Se me pegou, fez um péssimo trabalho, pois eu não faço o mau, eu acho.

No dia da minha formatura eu me vinguei, troquei a música tema, que era We Are The Champions para I Will Survive. Os acompanhantes dos estudantes ficaram chocados e eu só ria! Hahahaha.

… Foi inevitável, ele me pegou no beco, iria me bater de novo, pela sétima vez, eu não agüentei. Não fui eu que coloquei aquele vidro quebrado no chão, delegado, eu só peguei.

Será que eu poderia sair? Preciso chegar cedo em casa, quando meu pai ver essa situação vai me bater, me ajuda e conta pra ele que tavam xingando minha mãe?

Ecologia

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Em uma aula de Saneamento Ambiental, na faculdade, não pude deixar de ficar estressado. É fabuloso ver que a ideologia dominante domina a cabeça da maioria, digo isso, pois em praticamente todos os comentários a crença em que os humanos são parasitas que destroem a natureza está acoplada. Vejamos isso: “Onde o humano passa, ele destrói a natureza” – “O humano é um parasita, pois ele consome todos os recursos naturais até acabar de vez com a fonte” [1].

O humano é parte da natureza tanto quanto qualquer outro animal e dar-lhe o apelido de “parasita” é ignorar que todos os seres vivos absorvem algo da natureza para sua sobrevivência, de maneira que consiga sobreviver a todos os acontecimentos. Oras, o ser humano não é parasita, ele é parte do todo, não é um corpo estranho, mas eu creio que o pior deste comentário é o conceito de natureza que é expelido: a natureza seria um organismo vivo, complexo e Uno, seria A Natureza. Neste conceito o ser humano, sendo o corpo estranho, suga parte de sua energia vital para próprio benefício e como ele está explorando à passos enormes, a vida da natureza está acabando [1].

No entanto a natureza é a interdependência de vários fatores e de constantes catástrofes. Não seria o nosso principal combustível o produto e catástrofes anteriores? A Terra continuará viva, continuará bem, porém haverá mudanças, entre elas o fim da espécie humana, caso as mudanças naturais sejam de amplitudes suficientes [1]

Quem vai perder é a espécie humana, não a Terra.

Eu até poderia dizer que a pseudo-urgência em acabar com os males dos abusos ambientais é a real-urgência em manter a espécie humana viva, mas para isso seria necessário admitir que há um plano secreto de gênios cientistas que lançaram um desespero mundial de salvamento do meio ambiente como A Natureza, para aumentar a gravidade de um desastre que seria o da espécie humana. Mas, levando em conta a quantidade de cenas de filmes hollywoodianos que eu deveria aceitar como verdade para ficar com esta teoria, prefiro ainda tomar como base a mudança do capitalismo para sua forma mais cultural/ecológica após os movimentos de 1968 e época [1].

E é pelo medo que a ideologia da ecologia se torna hegemônica, o medo do novo, o medo do progresso, onde não podemos agir tecnologicamente por que o mundo está acabando, onde temos que consumir pouco e de maneira sustentável para sempre haver o recurso solicitado e etc, mas essas idéias, são idéias totalmente conservadoras, não há nada mais conservador que insistir no antigo, que ajustar tudo ao sustentável e ficar com o que já é de consciência geral e não buscar no progresso uma arma para acabar com a falta de recursos. Desenvolvimento sustentável é parte da merda conservadora, do medo do futuro, do medo do progresso, do medo do novo, do medo da adaptação e etc[1]

E, dentro dessa onda, grandes corporações “fazem sua parte”, não utilizando vegetais de determinados lugares, não emitindo substancias tóxicas na atmosfera ou destinando seus material para reciclagem, tentam humanizar um processo que é totalmente desumano, tentam humanizar a empresa capitalista que não tem vergonha nenhuma em lucrar até estourar. É esta contradição que passa a imagem de “Capitalismo com face humana”, como se a empresa que é o motor da violência inata do sistema econômico/político atual tentasse desviar o foco da verdadeira forma de violência, daquela que devemos ver e agir, para uma forma onde os culpados são os próprios consumidores.

E, então, a própria força contra os desastres ecológicos, os pseudo-ativistas e etc, se tornam itens de mercado. Acontece a união do hippie e do playboy, onde o resultado é o indivíduo vestido pela moda hippie ou, O Ecoboy [2].

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[1] Zizek, Slavoj – Vídeo: “Ecologia, o ópio do povo”, link:  www.youtube.com/watch?v=M0gVeRirQDg

[2] Zizek, Slavoj – Violence – Ed.: Picador, 2008.

Vandalismo

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Segunda-feira, dia 28 deste mês, um homem tentou matar um estudante dentro da faculdade por que não aceitava seu relacionamento com sua ex-namorada. O rapaz apontou na cabeça do atual namorado da mulher, disparou duas vezes, mas a arma falhou, depois encheu a cabeça da vítima de coronhadas. Será que se o assassinato fosse “consumado” a reação dos jornais e também dos cidadãos seria diferente da reação atual?

Esse terror com o ex-namorado ciumento já é tratado como algo normal, não seria melhor que a arma não tivesse falhado? Não seria melhor causar o impacto de uma morte insana e sem sentido do que um atentado com ferimentos poucos visíveis e que, no fim das contas, somente os participantes seriam realmente chacoalhados pela situação da sociedade? Talvez com mais vítimas, não seria melhor que algo horroroso aos olhos da massa tivesse acontecido?

Os crimes leves já são cócegas, não conseguem atingir agressivamente, eles já fazem parte da sociedade, já são intrínsecos e não vão se tornar parte estranha tão cedo. Se isso é verdade, uma caminhada mais rápida, uma agressão mais forte e um impacto maior não seria a solução?

Talvez com o balanço de um crime grave a sociedade fique atenta ao colapso na segurança e comece a questionar não somente ela, mas todas as práticas sociais, todas as instituições que deveriam nos proteger e ver qual é o real problema. Sendo assim, o vandalismo, o crime, a violência gratuita é uma arma contra o sistema vigente.

Vandalismo na avenida após campeonato paulista é um exemplo típico de agressão aos valores, aos costumes e às crenças da sociedade atual. Não por que é direcionado à ela, mas por que afeta o julgamento do que mantém os valores, costumes e etc em pé. Oras, não seriam as pichações, destruição de bens públicos, roubos à banco, à grandes supermercados, à grandes fábricas bons meios de chocar a população?

O vandalismo é uma arma que precisa ser usada, é ela que vai levantar o povo para uma ação com paixão pela destruição do sistema vigente. Por que existe a insistência de fazer greves? Se fossem causados prejuízos físicos às construções, será que não seria mais impactante? Será que não levaria mais e mais trabalhadores e trabalhadoras ao levante?  Ou ficar preso no sonho da racionalidade humana e da conversa com boa conclusão por todas as partes?

Não há algo que é bom para os dois lados, sempre um deles vai perder algo que acham que lhes é legítimo. O máximo que acontece é um lado conseguir um pouco do que deseja e o outro perder um pouco do que aproveitava, logo, as relações de superioridade, de submissão e sujeição continuariam, porém, com a corda mais folgada no pescoço do grupo não dominante na determinada luta em particular.

Mesmo depois de conversa, quando não há aceitação de um acordo, por que continuar insistindo em conversas? Vale à pena deixar os próprios princípios pra tentar chegar a uma conclusão teoricamente pacífica? Não será a conclusão pacífica somente uma forma de um lado manter a soberania e do outro continuar submisso?